O milagre de San Gennaro: o sangue coagulado feito líquido, mais uma vez. Nápoles, Itália - 2012.
ITÁLIA. Como todos os anos, desde de 1389, durante a comemoração da festa de San Gennaro, o milagre da liquefação do sangue, relíquia conservada em dois frascos, repetiu-se diante dos milhares de devotos que se reuniram dentro e no em torno da Capela do Tesouro da Catedral de Nápoles, Itália - às 9:22 da manhã de quarta-feira 19 de setembro (2012) - lembrança do mesmo dia do ano 305 d.C., quando o santo foi martirizado e morto.
A ampola foi apresentada à multidão pelo arcebispo da Cidade, cardeal Crescenzio Sepe em cerimônia compartilhada lado a lado com o prefeito de Nápoles Luigi de Magistris.
Busto-relicário de prata de San Gennaro sobre o altar da Catedral de Nápoles que, segundo a tradição, contém a cabeça (o crânio) do mártir.
O milagre acontece três vezes por ano, além de se liquefazer no dia dedicado ao santo, o fenômeno ocorre também em maio, mês dedicado à Virgem Maria e em 16 de dezembro.
O dia 16 de dezembro está relacionado a mais um prodígio atribuído ao santo. Em 1631, Vesúvio, o vulcão entrou em erupção. A convulsão telúrica era assustadora.
Então, as autoridades eclesiásticas de Nápoles resolveram organizar uma procissão levando a cabeça do mártir e uma ampola com sangue sagrado até a Igreja de Santa Catarina, em Formiello, próxima à montanha flamejante.
A erupção cessou imediatamente e todos os fenômenos associados, o fluxo de lava e a chuva de cinzas foram se atenuando e tudo terminou sem nenhuma vítima.
A GUERRA DOS SANTOS
A terceira data anual, em que o sangue coagulado torna-se líquido, é o sábado que antecede o primeiro domingo de maio. Esse dia está refere-se a um fenômeno natural associado a um marco político: a proclamação da República italiana, em 22 de janeiro de 1799 pondo um fim à monarquia, cujo rei, Fernando IV, da dinastia dos Bourbon, abandonou o Castelo de Sant'Elmo e fugiu, com destino à ilha da Sicília.
Porém, muitas pessoas ainda persistiam na defesa do antigo regime. Havia uma intensa e perigosa inquietação social marcada por conflitos violentos; um situação de guerra civil. Muitos devotos esperavam um sinal de San Gennaro que fosse capaz de acalmar os ânimos. E o sinal veio.
Novamente, o Vesúvio acordou furioso projetando línguas de fogo nas alturas. De certa forma, para alguns, parecia uma celebração da vitória dos republicanos, para outros, um castigo do céu. Mas o fato é que o vulcão ativo era uma terrível ameaça.
Para combater os monarquistas e tentar reestabelecer a ordem pública, entrou em cena, com suas tropas, o general francês Jean Etienne Championet. Foi uma luta cruel mas, no fim, Championet conseguiu dominar a situação e para provar que sua vitória tinha a benção divina, proibiu a pilhagem e a destruição das imagens sacras, ordenou ao clero que abrisse as Igrejas e aos padres que pregassem a paz. Além disso, foi pessoalmente à Capela do Tesouro pedir a benção de San Gennaro.
Na Capela, registram historiadores como Carlo di Nicola (FUENTES, 2012), o general chorou junto ao busto do santo. Então, perguntou onde estava colar que compunha a imagem. Informaram-lhe que o rei o levara embora em sua fuga. Horrorizado, Championet doou um novo colar, uma jóia valiosa para ornamentar a relíquia.
Todavia, nas sombras, Fernando IV tramava o retorno e pedia a proteção de Santo Antônio de Pádua enquanto acusava San Gennaro de traição por ter realizado o milagre de dezembro (em 1798) em meio à derrocada da monarquia.
Em 4 de maio de 1799, primeiro sábado do mês, foi organizada uma procissão para San Genaro. Naquele dia, esperava-se que a ocorrência ou não do milagre da liquefação do sangue desse um veredicto definitivo sobre a orientação política favorecida por Deus. Monarquia ou República.
O milagre aconteceu. A República era vitoriosa ou... parecia. Daquela vez, os acontecimentos subseqüentes convenceram o povo que o prodígio de San Gennaro fora mal interpretado. Teria sido, na verdade, um mau presságio para forças militares da França porque, um mês depois, uma contra-revolução retomava Nápoles e os Bourbons, retomaram a coroa e o cetro e os monarquistas comemoraram em 13 de junho de 1799, durante a festa de Santo Antonio de Pádua
Santo Antônio de Pádua e San Gennaro, aqui representados já em harmonia.
Como lembrança da Guerra dos Santos entre a Monarquia e a República Italianas, existem desenhos e pinturas nos quais Santo Antônio é representado empurrando San Genaro com uma vara. Na sabedoria popular, a expressão fazer um Santo Antônio tornou-se sinônimo de resolver as "causas impossíveis".
Mas, aos poucos, San Genaro foi retomando seu lugar de honra como padroeiro de Nápoles e no coração do povo. O culto renasceu com toda força tal como as erupções do Vesúvio, até porque, Santo Antônio de Pádua é de origem portuguesa e, no fim das contas, o sentimento nacionalista italiano falou mais alto.
FONTES
Napoli, il Miracolo di San Gennaro si ripete anche quest'anno.
NOTIZIE-
IN/ITÁLIA, publicado em 19/09/2012.
[http://notiziein.it/2012/09/19/napoli-il-miracolo-di-san-gennaro-si-ripete-anche-questanno/]
FUENTES, Marina Cepeda. Il Miracolo di San Gennaro e la Repubblica Napoletana del 1799.
TOTALITA/ITÁLIA, publicado em 19/09/2012.
[http://www.totalita.it/articolo.asp?articolo=1685&categoria=1&sezione=37&rubrica=]